24/08/2018

Relatório

Vamos fazendo o melhor uso possível 
dos dedos com que se queimam os fogos de artifício,
da tinta azul de pintar os carrosséis,
das palavras amargas na boca dos poetas.

Numa gaveta guardamos 
os nomes dos afogados
e sob um canteiro de jardim
as ferramentas do ódio.

Já queimamos todo o papel de carta.

E enquanto as crianças continuam 
a dançar nuas sobre a praia,
a rádio já só transmite os gritos dos abutres
e os polícias refugiaram-se nos olhos dos estudantes.

As espingardas, petrificadas, 
ainda servem para povoar os lagos.

José Manuel Simões, in "Sobras Completas"



12/08/2018

SINALIZAÇÃO OSSIFICADA A aranha-termómetro mergulhou no peso do meu nome e deixou que ele falasse gota a gota: «– O sexo-limbo é um composto sobrevivente... etc., etc.» Daí tirei conclusões que tudo me permitem: – A borracha-centopeia furada ao lado pela parede-telefone a invenção dum novo dialecto para falar às formigas a auto-fixação de um purificador nos buracos do vento uma complicação perfeita para objectificada em gesso morder o cio na boca... etc., etc. António Maria Lisboa, in "Ossóptico e Outros Poemas"