27/04/2019


picasso visto do porto

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no porto não havia «os» pessoanos e as questões do realismo
punham-se de são lázaro até ao passeio alegre, chegavam a matosinhos,
nas conversas sobre arte e no dia a dia lá em casa
para pagar na mercearia ou comprar sapatos novos.

o que também funcionava era uma sólida destruição
do real que o mantinha ferozmente
semelhante e rasgado e algumas coisas amavam-se com fulgor excessivo,
mas sem a coragem de se ir até ao último espasmo.

tudo isto foi uma longa aprendizagem do razoável, do portuense,
que é difícil de desfazer e às vezes nem é inteiramente triste.
os ricos destruíam vários equilíbrios
menos o do pôr do sol na foz do douro e uma certa cordialidade.

musa, é isso o que a trama, armada em anjo azul
e fulva de trejeitos vistos no cinema,
tudo muito anos vinte, tudo muito boquilha
nesses passos que esboça retardando a nudez.

Vasco Graça Moura

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