03/01/2020

A Confraria dos Escritores (excerto)

( . . . )
 

Estais aí sentados,
os olhos mergulhados na chávena de chá.
Os vossos cotovelos estão luzidios à força de escrevinhar.
Levantai os olhos dos vossos copos por terminar.
Libertai as vossas orelhas das guedelhas.

Vós
colados ao papel
das paredes,
meus caros,
que fazeis vós com o verbo?
Sabíeis
que quando não escrevia
François Villon
era bandido?

Vós
que sois prudentes
mesmo para agarrar numa faca de cortar papel,
pensar que é a vós que está confiada a beleza do mais magnífico dos [séculos!
Escrever ainda?
Hoje
a vida
é cem vezes mais interessante
mesmo a do último ajudante de notário.

Senhores poetas,
não estais já fartos
das páginas,
dos palácios,
do amor,
dos bosques de lilás?
Se chamam
criadores
a pessoas como vocês -
então quero lá saber da arte em geral.

Prefiro abrir uma loja.
Irei à Bolsa.
Os flancos eriçados com espessas toalhas.
Irei esvaziar a alma
berrando canções de bêbado
num privado de cabaré.

Vladimir Maiakovski, in "33 Poesias", pp. 66-67, trad. Adolfo Luxúria Canibal, Livraria Snob, 2ª ed., 2019



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